quarta-feira, 24 de junho de 2009

Um mineiro muito carioca

Geórgia Pereira, Acadêmica de Jornalismo da Universidade Estadual de Londrina - UEL.

Mineiro, bastante reservado como muitos de sua terra, e avesso à exposição pública, Rubem Fonseca, 81 anos, é um dos importantes nomes que compõem a produção literária no Brasil. Ele construiu ao longo de sua carreira, romances e contos que lhe caracterizam pela abordagem de temas densos, com linguagem sintética e ágil.

O autor está inserido na esfera das produções contemporâneas, que datam da década de 60. O marco de sua produção aconteceu com o livro de contos Feliz Ano Novo (1975), alvo de críticas e motivo de censura. Desde então, Fonseca apresentou estilo conciso e direto, imprimindo em seus textos, temáticas policiais e violentas, com assassinos, prostitutas e amantes.

Além do tom nitidamente policialesco, em que há geralmente um crime ou um mistério a ser desvendado, seus textos podem ser vistos como uma paródia do gênero policial tradicional, visto que os crimes atuam apenas como um disfarce de suas críticas a uma sociedade opressora do indivíduo.

Romancista e contista, Rubem imprime em suas obras um ritmo intenso na percepção dos acontecimentos, mas deixa a cargo de quem lê, a completude e a interpretação do enredo. Traz uma narrativa “curta e grossa” repleta de marcas de aspereza, retratando a realidade do subúrbio carioca. Sua literatura é crua, desnuda a ação humana sem nenhum pudor.

Mineiro de Juiz de Fora, José Rubem Fonseca nasceu no dia 11 de maio de 1975. Aos 8 anos foi para o Rio de Janeiro onde estudou Direito na antiga Faculdade de Direito da Universidade do Brasil. Depois de formado, iniciou sua carreira na polícia carioca, como comissário do 16º distrito. De acordo com alguns relatos, Fonseca se tornou policial pelos mesmos motivos que o comissário Mattos cita em "Agosto", romance do autor: "No meu caso, fora simplesmente a incapacidade de arranjar um emprego melhor. Depois de três anos advogando para criminosos pobres, sem ganhar dinheiro para pagar o aluguel do escritório, sem dinheiro para casar, surgira aquela oportunidade de trabalhar vinte e quatro horas e ter setenta e duas horas de folga".

Rubem Fonseca teve atuação de destaque no grupamento policial do Rio de Janeiro entre os anos de 1952 e 58, ficando mais tempo no cargo de policial de gabinete, responsável pelas relações públicas do setor. Muitas das experiências vividas durante este período estão registradas na obra “Aluno brilhante da Escola de Polícia”. Em 1953, Fonseca foi selecionado para fazer cursos de aperfeiçoamento nos Estados Unidos, local onde estudou administração na cidade de Nova York e posteriormente, comunicação em Boston. O mineiro deixou a polícia em 1958, quando foi exonerado do cargo e ingressou na empresa Light, atuando ali durante a década de 60. Com a saída da vida dos negócios, seu novo destino foi a literatura.

Uma das novas correntes inauguradas por Fonseca foi a que o crítico literário Alfredo Bosi classificou como “brutalista”. Bosi defende que não é uma questão de estilo, mas sim o retrato da sociedade repressora da época, já que tal significado foi reconhecido durante a ditadura militar brasileira. Com o término da ditadura, Fonseca conservou essa característica para fazer o retrato mundano da violência na sociedade carioca.

Já Antonio Candido faz uso do termo “realismo feroz” na tentativa de mostrar o traço marcante no trato com o texto e com os temas retratados nas suas produções. Escrever sobre as angústias de uma sociedade essencialmente urbana – e ser identificado por essa característica – é uma opção literária feita pelo escritor

As obras de destaque são seus livros de contos como Os primeiros (1963), A coleira do cão (1965), Lúcia MacCartney (1967), Feliz ano novo (1975) e O cobrador (1979). Dentre os romances, sobressaem O caso Morel (1973), A grande arte (1983), Bufo e Spallanzani (1986) e Vastas emoções e pensamentos imperfeitos (1988). Uma de suas últimas obras é intitulada “Ela e outras mulheres” que reúne 27 contos, todos com nomes próprios femininos, organizados em ordem alfabética. Tal obra foi vencedora do Prêmio Academia Brasileira de Ficção, Romance, Teatro e Conto em 2007. Além da produção de contos e romances, o autor também contribui para a produção cinematográfica, produzindo roteiros para filmes como “O Homem do ano” dirigido por José Henrique Fonseca, filho do autor, “Bufo & Spallanzani” e Relatório de um Homem Casado”, ambos dirigidos por Flávio Tambelini e “A Grande Arte”, dirigido por Walter Salles Jr.

Mais do que dialogar com os leitores sobre temas que incomodam, a escrita fonsequiana coloca o ser humano no centro de todas as coisas, revelando a complexidade de uma existência quase sempre sem sentido.

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